quarta-feira, 11 de novembro de 2009

O Contrato Social

Se tivermos em conta que todos os homens são aproximadamente iguais em força física, e mesmo em poder e capacidade mental, antes de cultivados pela educação, teremos então de admitir que só o consentimento de cada um poderia, ao princípio, levá-los a associarem-se e submeterem-se a qualquer autoridade. O povo, se remontarmos à primitiva origem do governo nas florestas e nos desertos, é a fonte de todo e qualquer poder e jurisdição; voluntariamente, para bem da paz e da ordem, os homens renunciaram à sua liberdade natural e acataram leis ditadas pelos seus iguais e companheiros. As condições sob as quais se dispuseram à submissão ou foram expressas, ou eram tão claras e óbvias que se podia perfeitamente considerar inútil exprimi-las. Ora, se é isto que se entende por contrato original, é inegável que todo o governo assenta, de início, num contrato, e que as mais antigas e toscas associações humanas se constituíram essencialmente em virtude desse princípio. Seria inútil perguntar em que registos consta essa carta das nossas liberdades: não foi escrita em pergaminho, nem em folhas ou cascas de árvores; precedeu o uso da escrita e de todas as outras artes civilizadas da vida. Mas descobrimo-la claramente na natureza do homem, na igualdade, ou algo semelhante à igualdade, que verificamos existir entre todos os indivíduos dessa espécie. A força que actualmente predomina, baseada nas frotas e nos exércitos, é apenas política, e deriva da autoridade, a qual é consequência da instituição do governo. A força natural de um homem consiste apenas no vigor dos seus membros e na firmeza da sua coragem, qualidades estas que jamais poderiam submeter multidões ao domínio de um só homem. Só o seu próprio consentimento, e a sua noção das vantagens resultantes da paz e da ordem, poderia ter essa influência.

David Hume,
Ensaios Morais, Políticos e Literários

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Para consulta:
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Questões para discussão:
  • O Contrato Social implica a renúncia à liberdade natural do Homem?
  • O Contrato Social é fruto de um consentimento ou de uma submissão?
  • O Contrato Social é indissociável da autoridade do Estado?

3 comentários:

  1. Lançado o tema de discussão "O Contrato Social é indissociável da autoridade do Estado?" sugiro um tema de investigação:
    Defendendo a tese que os cidadãos do mundo livre se podem desvincular de alguns dos deveres cívicos, caso o Estado não cumpra com os seus deveres, lanço a questão, para demanda:
    quais as circunstâncias em que se possa admitir que os cidadãos desistam, legitimamente de votar? Sugestão para a investigação: identificar situações em que o Estado não cumpra o seu papel de acesso às oportunidades. Por exemplo, se um Estado não aplica leis anti-corrupção credíveis, não estará a condicionar o acesso às oportunidades?

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  2. A propósito do Contrato Social (em toda a sua extensão)deixo aqui o comentário que inseri aqui:

    O tema que aqui trouxeram é exactamente o tema que eu tinha intenção de colocar à discussão numa segunda parte do Chat (na moodle), caso este funcionasse com estabilidade. Com efeito, a 29 de Agosto do corrente ano, o Expresso trazia, no 1.º Caderno, uma separata intitulada: “O fim da democracia representativa?”
    Dos muitos temas em análise, chamo a atenção para dois. “Temos uma democracia partidária que está falida”; “A web é uma melhor democracia representativa”.
    Uma questão: (…) “No mundo pré-YouTube, Obama teria sido eleito? Claramente não.” Nem Ségolène Royal teria vencido as primárias dop seu partido sem o seu blogue “Désir d’Avenir”, onde croiu uma rede descentralizada de apoio”.
    Em muitos outros países (Reino Unido, Grécia, Suécia, etc.) o uso da web tem permitido a emergência de novos líderes e de novas formas de fazer política.
    “A web não é a democracia directa, mas sim uma melhor democracia representativa; com mais responsabilidade e exposição em tempo real. (…)”
    Deixo uma questão: será desejável (possível é) que passemos a usar a electrónica e a Internet para procurarmos uma síntese entre democracia representativa e democracia directa)? Passarmos a votar, não de acordo com um ideário político, mas de acordo com o maior bem para o maior número? Poderemos votar de modo utilitarista? “A ideia é a de levar a decisão dos eleitores, sem filtros, até aos centros de decisão”. Num site colocam-se temas para discussão (como neste blogue), argumenta-se e, depois, vota-se on-line. Na consulta feita, após se definirem possíveis respostas, por exemplo, a um Referendo, sai vencedora a proposta mais votada…

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