Se tivermos em conta que todos os homens são aproximadamente iguais em força física, e mesmo em poder e capacidade mental, antes de cultivados pela educação, teremos então de admitir que só o consentimento de cada um poderia, ao princípio, levá-los a associarem-se e submeterem-se a qualquer autoridade. O povo, se remontarmos à primitiva origem do governo nas florestas e nos desertos, é a fonte de todo e qualquer poder e jurisdição; voluntariamente, para bem da paz e da ordem, os homens renunciaram à sua liberdade natural e acataram leis ditadas pelos seus iguais e companheiros. As condições sob as quais se dispuseram à submissão ou foram expressas, ou eram tão claras e óbvias que se podia perfeitamente considerar inútil exprimi-las. Ora, se é isto que se entende por contrato original, é inegável que todo o governo assenta, de início, num contrato, e que as mais antigas e toscas associações humanas se constituíram essencialmente em virtude desse princípio. Seria inútil perguntar em que registos consta essa carta das nossas liberdades: não foi escrita em pergaminho, nem em folhas ou cascas de árvores; precedeu o uso da escrita e de todas as outras artes civilizadas da vida. Mas descobrimo-la claramente na natureza do homem,
na igualdade, ou algo semelhante à igualdade, que verificamos existir entre todos os indivíduos dessa espécie. A força que actualmente predomina, baseada nas frotas e nos exércitos, é apenas política, e deriva da autoridade, a qual é consequência da instituição do governo. A força natural de um homem consiste apenas no vigor dos seus membros e na firmeza da sua coragem, qualidades estas que jamais poderiam submeter multidões ao domínio de um só homem. Só o seu próprio consentimento, e a sua noção das vantagens resultantes da paz e da ordem, poderia ter essa influência.
David Hume,
Ensaios Morais, Políticos e Literários
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Para consulta:
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Questões para discussão:
- O Contrato Social implica a renúncia à liberdade natural do Homem?
- O Contrato Social é fruto de um consentimento ou de uma submissão?
- O Contrato Social é indissociável da autoridade do Estado?